domingo, 17 de outubro de 2010

"A Conquista da Felicidade", parte 2.6 (Os interesses impessoais)


“Um homem de ciência, por exemplo, deve manter-se a par das investigações que se realizam na sua especialidade. Em relação a tais investigações os seus sentimentos manifestam tanto calor e vivacidade como em relação a qualquer outra coisa intimamente relacionada com a sua carreira; mas é com espírito completamente diferente, não profissional, menos crítico, mais desinteressado que lerá qualquer livro sobre as investigações feitas num ramo científico diferente do seu. Mesmo que tenha de fazer algum esforço intelectual para acompanhar a leitura, apesar disso essa leitura será para ele uma distracção por não estar ligada às suas responsabilidades. Se o livro lhe interessar, esse interesse é puramente impessoal, num sentido que não se pode aplicar aos livros sobre a sua própria especialidade.”

“A não ser no sono, o consciente nunca repousa para o subconsciente amadurecer gradualmente os problemas inquietantes. (…) O que é repousante nos interesses exteriores é o facto de não exigirem qualquer acção. Tomar decisões e exercer a sua vontade é bastante fatigante, especialmente quando é necessário fazê-lo apressadamente e sem o auxílio do subconsciente. Têm razão os que pensam que ‘a noite é boa conselheira’ e que devem dormir primeiro antes de tomar alguma decisão importante, mas não é somente no sono que o processo mental do subconsciente pode realizar-se. Pode igualmente realizar-se quando o consciente está ocupado em qualquer outra coisa. O homem que consegue esquecer o seu trabalho quando este finda e não pensa mais nele até ao dia seguinte, fá-lo-á provavelmente muito melhor do que um outro que se atormente a pensar nele em todo o tempo de descanso. E se tiver outros interesses além do seu trabalho, ser-lhe-á muito mais fácil esquecê-lo quando é preciso. É essencial, no entanto, que esses interesses não ocupem as faculdades já exaustas por um dia de labor.”

“Um dos defeitos do moderno ensino superior é desenvolver em demasia a instrução de certos ramos do saber e muito pouco o enriquecimento do espírito e do coração por uma imagem imparcial do mundo.”

“Um homem de grande vitalidade e com gosto de viver passará por cima de todos os infortúnios, porque nele renasce sempre, depois de cada revés, o interesse pela vida e pelo mundo, o qual não pode ser limitado ao ponto de tornar uma perda fatal. Ser vencido por uma perda, ou mesmo por várias, não deve ser admirado como prova de sensibilidade, mas sim deplorado como falta de vitalidade. Todas as nossas afeições estão à mercê da morte que pode ceifar, a cada momento, aqueles que amamos.”
Bertrand Russel

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